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Bibliografia

Sobre: Exposição “Diário de Coleccionador” em Abril 2011
Por: Teresa Paixão

 
 
 
A verdade é que não quero falar da Catarina pintora, só quero saber da Catarina pessoa.
A verdade é que conheci primeiro a Catarina pintora e, felizmente, pude conhecer a Catarina pessoa.
A verdade é que a Catarina pessoa não vive sem a Catarina pintora e vice-versa.
A verdade é que se não fosse a Catarina pintora eu não teria conhecido a Catarina pessoa.

E esta exposição, estes quadros, estas reflexões, são mais representativas das duas Catarinas do que quaisquer outros que engoli com os olhos (os olhos, sobretudo, comem quadros).

A Catarina pessoa é um armazém de lembranças que não são saudosistas. É um álbum de recordações de tempos e de gente que a rodearam e nunca a abandonaram, mas a quem ela nunca permitiu que lhe trancassem a imaginação. É um estandarte da alegria que usa as sombras, não para ensombrar, mas para amainar. Que sabe dar ao antes o valor do agora e até do depois.

A Catarina pessoa andou em arrumações e encontrou histórias, coleções, épocas e nomes que, em alguns casos, nem conheceu. As mesmas mãos que arrumaram e os mesmos olhos que escolheram e verificaram o que era cada pedaço de papel, cada coisa, cada recordação, entregaram tudo à Catarina pintora que lhes deu uma nova vida, os tirou do esquecimento, e os transformou em objetos que, no futuro, serão memória de outros.

Estes são quadros para descobrir como um jogo: o que diz aqui? que papel é este? que material aqui está?… e com a mão, devagarinho, tal como fazemos quando mexemos no que nos é precioso, apalpar para que os sentidos sejam todos afagados. Só lhes falta terem cheiros.

Quem disse que a memória não é criativa?

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Sobre: Exposição “Uma Planta sobre a Terra” em Março de 2010
Por: José Tolentino Mendonça

O Precioso Herbário de Catarina Castel-Branco acorda-me para uma frase de Matisse: “É necessário que isto repouse em mim como uma planta sobre a terra”.
Que necessidade é esta de que as imagens nos aproximam?
Não saberemos dizer. O que decide cada uma destas imagens, o seu sopro íntimo, a fulgurante epifania que constroem, reside nesse silêncio.
Há um saber anterior aos saberes, um saber ao mesmo tempo comum e incomunicável, uma necessidade não verbalizável por discursos, mas por lampejos, por estampidos…uma caligrafia que avança por relâmpagos.
Nós somos “isto”.
Esta massa pictórica impura, esta vertigem de terra e tormento, esta fina crosta isolada, este lençol de água sem câmbio, este mapa que os lírios desenham, este milagre por explicar.
Nós somos “isto”.
Esta convulsão de penumbra e luz, este azul esverdeado vítreo, este disparo que salpica o futuro, este indefinível enigma por toda a parte. Não somos a palavra: somos a voz, o vagido, o gemido, o grito. Não somos a casa: somos o relento e o jardim. Somos “isto”.
E “É necessário que isto repouse em mim como uma planta sobre a terra”. Para quem quiser ver, as imagens de Catarina Castel-Branco modelam pacientemente a sabedoria.  


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Sobre: Exposição “Silêncios” em Março 2009
Por: Luísa Costa Gomes

Duas ideias fortes na origem desta série de desenhos e serigrafias: a primeira vem da universalidade dos traços fisionómicos no humano para a procura da singularidade de uma cara única; a segunda procura mostrar a violência desumana contra as mulheres. A Catarina começou a pintar caras em acrílico, mas elas não lhe apareciam individuais, apenas conjuntos de formas: a pintura, diz ela, ressentia-se da fragilidade do desenho. Começando a desenhar, “volta a olhar” e recuou até ao novo princípio. Fez experiências com papel, sobretudo usando colas diversas e papel japonês, deixou acontecer coisas diferentes, que depois integrava no processo. Primeiro pensou fazer “retratos no jardim” e apareceram ramadas que genealogicamente se bifurcam noutras ramadas e fluem sempre. Quando viu as caras pintadas de branco, de amarelo, de cor-de-rosa, das mulheres e dos homens das tribos do rio Lomo na Etiópia, a distância entre o negro e o branco esbateu-se e a familiaridade, a sequência, tornou-se mais evidente. O papel vegetal foi o meio perfeito para fabricar estas peles e estas carnações. A serigrafia o meio perfeito para falar do negativo, da sombra, do desvanecimento da cara – a nossa identidade mais vulnerável. A Catarina diz que, ao desenhar, teve a nítida sensação de estar a fabricar a pele das suas criaturas e “houve caras que me assustaram de tanto olharem para mim”. De facto, o olhar a direito é o que mais nos convoca e intimida. Sobretudo como aqui, em alguns retratos, quando esse olhar parece vir a direito mas se desvia afinal para o seu próprio interior. “Estas pessoas estão mesmo em silêncio” diz Catarina “aquele silêncio fundo das pessoas que não podem fazer nada. Todas elas têm uma expressão de dignidade triste.”

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Sobre: Exposição “Jardins Inabitados” em Abril de 2005
Por: José Sommer Ribeiro

Catarina Castel-Branco dedicou um largo período da sua vida artística à gravura.
São notáveis as suas naturezas mortas, de excepcional qualidade, bem reveladoras dos seus grandes conhecimentos das variadíssimas técnicas de impressão.
Ao apresentar agora a série dos Jardins Inabitados, é de assinalar quanto foi importante essa longa aprendizagem. As suas obras recentes, que utilizam uma técnica mista – acrílico com suporte de serigrafia – são de uma riqueza matérica invulgar.
O seu trabalho é assim extremamente pessoal, não só no campo da técnica mas também da composição.


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Sobre: Exposição “Frutos de Inverno/Armários de Canto” em Maio de 2001
Por: Luísa Costa Gomes

Salta à vista tanta luz. Não é coisa que normalmente se associe ao sótão, à cave, às casas que guardam coisas. O escuro ficou para trás, só há dança de cores terrosas que de vez em quando se decidem, como num jogo de cadeiras, quando a Catarina olha – e elas correm a sentar-se nas suas formas, as formas que lhes assentam. O movimento fixo das coisas apanhadas de surpresa. Sentam-se nas prateleiras contra o fundo antigo. Há uma altura em que se põem a falar. Suspensos em seus baloiços de cordel, melões conversam.
Conversa de melão, melancólica, aérea, falha de raízes, sujeita a ventos, a que a maçã vermelha e a romã nem ligam. Elas é que são redondas! Sabem-se frutos de despensa, frutos de Inverno, nos armários do canto, à espera de serem comidos pela família. Vêm da cave, sobem para conviver à mesa, e depois ao sótão pela mão da Catarina. No aconchego onde paira esse espírito protector, os frutos frutificam.
Há uma altura em que se tem de olhar nos olhos esses frutos, sempre os mesmos, sempre os outros, e a melhor maneira de os olha é cá dentro. Desarrumados na nossa lembrança deles, gravados na calda do amor e da casa. Laranjas e romãs e peras e maçãs, conversa e memória – o quadro sustém-se nas guardas das prateleiras, seguro nessas traves mestras.



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Sobre: Exposição “Porcelana e Papel” em Julho de 1992
Por: Pedro Tamen

Tal como dentro e fora não se sabe
e melhor fora não haver distância
ou que defina o que é o quê e o quem,
também aqui e ali são só lugares
de uma viagem que se faz depressa:
pontos de um espaço de uma vida a passo.

Por isso a leve jarra que veio de tão longe
tão perto está de nós, mesmo que vá
e leve para si seus sabedores motivos:
ei-los na mão tão confundidos já
neste papel, nesta parede e olhos,
como estão e estiveram desde sempre
aflorando a terra feita ao forno
onde aterraram a primeira vez.


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Sobre: Exposição “Instrumentos” em Março de 1991

Por: Fernando de Azevedo

Lembro-me de antigos desenhos, gravuras e ainda de pinturas de Catarina Castel-Branco que tomei sempre por vindos de uma sensibilidade intimista. Um desenho depurado, quase ausente de matéria, uma espécie de marca das coisas só. Nada de débil, por outro lado, nem de fuga, tão pouco, quer à realidade quer à existência dos objectos. Também não tratava a pintura, pareceu-me, de uma delicada aparência das coisas, subtraindo-lhes o recheio, a materialidade grosseira, para delas registar apenas um sopro da passagem neste mundo. Eram vistas mais como se vêm os seres silenciosos e com eles os objectos da sua convivência, silenciosos também.
No silêncio, cada vez, cada coisa, não podem ser exuberantes. Tudo aí nos fala mas sem se fazer ouvir. É porventura mais nítida no silêncio uma forma do que em pleno som. Também se torna mais possível agarrar-lhe o essencial e abandonar o que lhe é, senão exterior, pelo menos efeito, enfeite, demais. Nessas obras Catarina Castel-Branco reduzia tudo a lâminas e estilisticamente agudizava os objectos. Havia nelas uma linha perseguida de um modo tal que me lembrava um tempo miserabilista da pintura, no pós-guerra francês, mas não era bem isso. Sei agora que não era isso. Nenhum histrionismo social por detrás, mas antes o despojamento de qualquer enfâse; apenas o espaço e os objectos. Apenas e só a interrupção linear que os rodeia na folha branca de papel, no branco distendido da tela.
Terá a pintora passado do seu antigo silêncio para outro universo? Terá deixado que a sua intimidade tenha sido tocada de ruído, tal como se água alastrasse no papel há pouco seco, anguloso, quase árido? Assim parece. Vêm-se de novo desenhos, gravuras, quadros seus: onde havia essa serenidade horizontal, assente num espaço sólido, há agora um outro bulício, a procura vertical, um espaço em desdobramento, em fuga. Na sua origem, a música, o deslumbramento barroco, o contacto com a Holanda essencialmente, uma escola de arte, os construtores de instrumentos de corda, a revelação da escrita musical enquanto escrita e sedução gráfica. O mundo em que a pintora se amplia fora dos antigos objectos, flores, outras referências pessoais, intimas, é agora o da música na sua consonância visual e sonora; ou melhor, no pretexto sonoro para uma visualização interposta.
Uma espécie de paixão instala a constância do tema e nada existe para fora dele, ou quase nada. Na gravura, as técnicas são perseguidas por ele. Técnicas que partem dos processos puros e do seu complexo conhecimento e prática, para depois os anularem por sobreposição, por mistura. Assim, com a xilografia, por vezes considerados incompatíveis, e que, no seu gosto de descoberta, de experimentar, a artista funde ou faz surgir numa segunda, numa terceira imagem, sobrepostas. Importante a cor, impressa, não raro com um só rodo, numa subtilíssima e difícil fusão de bordos e passagens. Uma fluência e liberdade de linguagens aborda, deste modo, uma permanência e exclusividade do assunto, do tema. O traço do violino, a pauta e escrita são como que personagens; com eles recria constantemente um namoro objectual e a reposição de formas onde a própria suspensão, isto é, o incompleto sugere, por um lado, e o ritmo, por outro, um clima e a sua emoção permanente; as citações ou referências, as caligrafias, as assinaturas, os nomes mágicos, Bach, Mozart, Stradivarius, não são propriamente alusivos, entram no contexto caligráfico que se desenvolve nas obras, que é acusado tanto nas gravuras, como no desenho (talvez aqui mais voluntariamente escultórica a organização espacial), como na pintura.
Mas o que parece ter a pintora querido, desejado, foi um nexo, aglutinado por essa experiência técnica, a carga emotiva do caligrafismo pautado e a sua própria necessidade interior de «escrever» o desenho. Tudo isso, recorrendo a planos sucessivos onde as caligrafias passam como «momentos» dos objectos musicais. Há nela, por vezes, algo de um recomeço cubista (português até na inesperada lembrança da planificação de Sousa-Cardoso). E a inserção de um elemento nostálgico-paisagístico no cimo ou no baixo de um plano-écran, de um simples plano de acompanhamento, passa não só a figura, mas ainda, a abertura ao espaço sentimental.
E outra coisa não são os papeis-pautas do que espaço sentimental. Como os outros, os seus, onde não escreve a música que investiga como caligrafia e memória, mas grava a ideia e o seu sentimento; mas onde também se condensa e revive o gosto do ofício ou a poesia do ofício. Da pauta branca ao papel de desenho, Catarina Castel-Branco vê como que um ofício só. Entre uma e outro, a folha de papel, as folhas de papel, melhor dito. O papel do artista,, poderíamos dizer, se o humor pudesse interferir em coisas tão sérias, sem as destruir, como são aqueles a que os criadores votam o início e os fins da vida. E não está tão longe, afinal, do seu silêncio, ora grave, ora risonho, que referi a princípio. O que eu queria dizer era que quase poderíamos concentrar essas obras nas regras da natureza-morta (que consente, sobretudo, os grandes silêncios e, em certos momentos da pintura, a investigação do seu segredo). Creio que, na pintura que faz presentemente, Catarina Castel-Branco recomeça (ou continua), com diferente sonoridade entretanto desperta, o seu íntimo diálogo com a natureza-morta.